Empresas querem dar sentido ao trabalho
Experiências são as saídas de grandes marcas para envolver seus colaboradores
A motivação de funcionários nem sempre precisa estar associada a bônus em dinheiro ou aumento de salário. Excelentes resultados podem ser obtidos com custo zero para a empresa. "Saber que o seu trabalho pode fazer a diferença na vida de pessoas é muito mais efetivo para extrair o máximo da equipe do que a promessa de participação nos resultados", diz Oscar Porto, diretor-geral da Medtronic no Brasil, fabricante de equipamentos médicos. Sua empresa organiza todo fim de ano o Holiday Program, evento criado pela companhia nos Estados Unidos, onde clientes contam aos funcionários o quanto são beneficiados pelos produtos da empresa.
Na versão mais recente realizada pela subsidiária brasileira, um dos convidados foi um menino de quatro anos que nasceu com diabete e utiliza uma bomba de infusão de insulina, equipamento que carrega na cintura. "Foi uma lição de vida. O menino conquistou a todos e a mãe dele relatou, emocionada, como o aparelho os ajuda a levar uma vida normal", descreve Alessandra Souza, especialista de produtos na área de diabete.
Para Porto, a experiência se torna tão marcante na memória dos colaboradores que os ajuda a enfrentar períodos de dificuldades que eventualmente ocorram no futuro. No exterior, essa modalidade de incentivo que busca dar um sentido ao trabalho das pessoas, mostrando aos funcionários os benefícios que seu trabalho traz à sociedade, vem se popularizando.
CasesA Volvo, por exemplo, criou uma comunidade na internet chamada "Volvo Saved My Life Club" onde os proprietários de carros da marca contam como os sistemas de segurança utilizados pela companhia para salvar suas vidas em acidentes. A fabricante de celulares Qualicomm, por sua vez, colhe depoimentos de clientes que usaram seus aparelhos em situações de emergência para chamar por socorro. A intenção é motivar a equipe mostrando que o trabalho deles ajudou a salvar vidas.
Outras formas de incentivo que também não estão diretamente relacionadas à remuneração vêm ganhando espaço nas companhias no Brasil. Entre reconhecer o desempenho oferecendo uma viagem de sete dias à Africa do Sul, durante a Copa do Mundo, - com direito a presenciar um jogo da seleção brasileira - ou o valor correspondente em dinheiro, o Ponto Frio aposta que a viagem terá um efeito muito mais duradouro na motivação da equipe.
Por esta razão, estabeleceu esse prêmio para 12 gerentes e diretores regionais cujas equipes alcançaram o maior volume de vendas de dois serviços - garantia estendida e seguro residencial - no último quadrimestre do ano passado. "O dinheiro vai embora rapidinho e uma semana depois a pessoa já nem sabe mais onde gastou. Já uma viagem como essa será lembrada pelo resto da vida, uma daquelas histórias para contar aos netos", diz o gerente de recursos humanos, Cassiano Vianna.
Enquanto os contemplados preparam as malas, a empresa comemora o acréscimo de 41% nas vendas de garantia estendida e 20% no seguro residencial em comparação ao último quadrimestre do ano anterior. Um dos vencedores da promoção, o diretor regional do Sul, Paulo Drago, conta que a disputa foi acirrada até o último momento. "Faltando uma semana, estávamos apenas 0,03% à frente da segunda colocada. Liguei então para 50 gerentes de lojas e fiz uma verdadeira blitz para garantir a minha passagem. Conseguimos aumentar a vantagem para 0,16% e cruzamos a reta final na frente, mas agora vou ter que trazer uma mala só de lembrancinhas para esse pessoal todo", brinca.
Experiência ganha versão brasileiraAs empresas brasileiras também começam a despertar para o chamado "marketing de experiência", já bastante difundido na Europa e nos Estados Unidos. Lá, os gestores de recursos humanos perceberam que prêmios em dinheiro já não tinham o mesmo efeito de antes como fator motivacional pelo simples fato de que as pessoas já possuem todos os bens de consumo mais importantes. O que estava faltando, para muitas delas, era o acúmulo de experiências de vida significativas, que escapassem do cotidiano entre casa, trabalho e estudo. No rastro dessa tendência, surgiram no Brasil empresas especializadas em fornecer esses pacotes, como é o caso da O Melhor da Vida.
A tendência de reforçar os incentivos não-financeiros foi confirmada pelo Hay Group em uma pesquisa recente que ouviu 763 organizações de 66 países onde 64% das empresas revelaram a intenção de dar maior ênfase ao valor motivacional dos seus programas de recompensa ao longo dos próximos três anos. "Nos períodos em que os orçamentos ficam mais apertados, como ocorreu durante a crise financeira global, manter a força de trabalho envolvida é muito mais difícil. Empresas que cultivam formas não-financeiras de motivação levam grande vantagem em momentos assim", diz Carlos Siqueira, diretor do Hay Group no Brasil.
Os resultados de programas do gênero não se limitam a economizar dinheiro. Passam também por manter um bom ambiente de trabalho, valorizar a conquista de objetivos e reforçar a sensação de pertencimento, fatores importantes para a retenção de talentos. Outra pesquisa do final do ano passado, realizada nos Estados Unidos pela McKinsey, revelou que os três principais fatores de motivação sem custo: elogios dos chefes imediatos; atenção das lideranças (conversas individuais de feedback, por exemplo); e oportunidade de liderar projetos. Estes fatores contribuem mais para que as pessoas se sintam valorizadas do que os três maiores motivadores financeiros (bônus em dinheiro, aumento de salário e stock options).
Clareza para evitar problemasPara evitar que os programas de incentivos não-financeiros tenham algum tipo de efeito contrário ao imaginado como causar frustrações entre quem não é contemplado, Carlos Siqueira, do Hay Group, recomenda que tudo seja muito bem comunicado e que as regras estejam claramente estabelecidas. Cumprido esse requisito, ele considera que os estímulos não-financeiros serão cada vez mais importantes como aliados na retenção de talentos. "O que faz uma pessoa resistir a eventuais propostas salariais maiores são os valores intangíveis oferecidos pela empresa, como um bom clima de trabalho, reconhecimento por parte do chefe e perspectiva de crescimento. Tudo o que puder ser feito para reforçar essas características é bem-vindo", considera.
Para o diretor de recursos humanos do McDonalds no Brasil, Luis Bueno, a eficácia de programas do gênero está muito associada à adequação ao público-alvo. Considerando a faixa etária predominante dos seus funcionários (70% dos 48 mil colaboradores no país têm entre 16 e 22 anos), a empresa desenvolveu uma série de atividades que se assemelham a uma gincana permanente.
Há disputas entre lojas que incluem desde jogos de perguntas e respostas sobre os produtos da casa até a competição por uma maior economia de energia. Os vencedores recebem prêmios em dinheiro virtual, a McGrana, que pode ser acumulado ao longo do ano e trocado por prêmios, que vão desde cargas para celular e chapinhas (o brinde preferido pelas meninas) até geladeiras, para aqueles que conseguem acumular uma pontuação mais alta. "Não há dúvida de que o salário é o grande incentivador de qualquer profissional, mas em muitos casos não há como escapar da média de mercado. Esses programas surgem então como um diferencial, pois todo jovem gosta de ganhar coisas e de trabalhar em um lugar que possa ser também divertido", diz Bueno.No nível mais "adulto", as premiações não-financeiras do McDonalds incluem viagens anuais aos Estados Unidos, com acompanhante, para os dez melhores gerentes de restaurante no Brasil, condição mensurada por meio de uma série de indicadores que envolvem resultados financeiros, qualidade da operação e gestão de pessoas. Os vencedores são homenageados com um jantar de gala reunindo funcionários de destaque do mundo todo e têm direito a uma semana de passeio pelos melhores parques temáticos dos Estados Unidos.
terça-feira, 6 de abril de 2010
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